8.6.06

Fernando Variações & António Pessoa


Alguma coisa se passa. Primeiro, não querem ir à rua; depois não querem vir para a casa. Não querem tomar banho; depois não querem sair da banheira. À noite, não se querem deitar; de manhã, não se levantam por nada. O mais novo, quando quer que eu acenda a luz, pede-me que a apague. Quando desce umas escadas, diz que as está a subir. Quanto ao mais velho, é do contra. Sempre. Não importa o que dizemos. E, se por táctica calculada, invertemos o sentido do discurso, logo ele se opõe, com todas as armas, ao que lhe propomos, mesmo tratando-se do oposto do que primeiro lhe tínhamos proposto e que ele também, como calculam, contrariara. Sim, alguma coisa se passa... Andarão, secretamente, a ouvir António Variações: "Estou bem onde não estou / Só quero ir aonde não vou"? A ler Fernando Pessoa às escondidas: "Ah, poder ser tu, sendo eu! / Ter a tua alegre inconsciência, / E a consciência disso!" Parece que sim, que alguma coisa se passa. Eu só não sei o quê.

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