30.6.06

"a bola é

redonda, são 11 de cada lado e, no fim, ganha a Alemanha"?

O Exame (2ª Parte)


Hoje, no exame (difícil) de Literatura Portuguesa, nos segundos 45 minutos (Grupo II), o Conde Nun'Álvares Pereira fez o mesmo que o Zidane & Companhia, na 2ª-feira à noite: deu uma valente coça nos "castelãos" (castelhanos) e mandou-os mais cedo para casa. O Fernão Lopes conta tudo na sua Crónica de D. João I: "(...) O Conde e toda a sua gente eram todos a pé terra, que os recebiam de vontade; e porque eram poucos e os castelãos muitos, fazia-os o Mestre* poer em gram trabalho; e a batalha** era bem pelejada d'ambalas partes, rompendo porém os portugueses a gente dos castelãos per força, de guisa que o Mestre entendeo que os do seu bando queriam fugir. (...)" E tudo termina, mais adiante, com a fuga dos castelhanos e a vitória dos portugueses. Terá sido este o capítulo que o Pauleta leu na noite anterior à conferência de imprensa? Bem escolhido!

(*Mestre de Santiago, o comandante do exército castelhano.
**Batalha de Valverde.)

Foi Há Vinte Anos!


Já tivemos o Portugal-Holanda e o França-Espanha. Mas agora é que é, com as meias-finais já ali. O Alemanha-Argentina de daqui a pouco vai ser, quase ponho as mãos no fogo, um jogo fabuloso... A fazer lembrar outros tempos, outros jogos (quando eu tinha 18 anos, lembram-se, ó intelectuais & artistas plásticos da Margem Sul?).

29.6.06

Acender o Mundo

O Mais Novo tem qualquer coisa de poeta surrealista: "Pai, já não quero dormir mais. Podes acender o estore?" Claro que não, prosaico como sou. Mas posso registar aqui esta forma brilhante de levantar a luz. Com versos como estes preciso mesmo de ler Breton?

No Sítio Certo, Na Hora Certa


Chega o primeiro e diz: "A melhor hora na Quinta da Laborteira é a do almoço!" Portanto, não a de semear as batatas, nem de regar o feijão, nem a de apanhar os tomates, etc. Chega o segundo e confirma: "A melhor hora na Quinta da Laborteira é a do almoço!". Façamos, então, o teste: peixinhos do rio (ou melhor, de uma barragem alentejana: achigã, barbo...) fritos às fatias (usa-se, pelos vistos, a máquina de cortar fiambre... para atenuar o incómodo das muitas espinhas fininhas), mais "jaquinzinhos", também de fritura, com arroz de tomate e pimento. Delicioso! Disto não têm os ingleses! O vinho é de Azeitão, de uma tal Quinta da Califórnia, que desconheço e me parece o elo mais fraco da coisa (mas que sei eu, J., deste assunto?). Café, biscoitos e ameixas vermelhas, de sobremesa. Sim, por uma vez, cheguei a um sítio no momento certo. Mesmo em cima da melhor hora.

Estamos Em Guerra?


Em dia de Feriado Municipal (São Pedro), a ideia era preguiçar, aproveitar para (re)conhecer mais demoradamente o agradável Vale dos Lençóis. Mas, desde muito cedo, as forças vivas cá da terra decidiram contrariar as minhas intenções. Primeiro, foram os foguetes e os morteiros da alvorada. Depois, as fanfarras e as bandas, avenida acima, avenida abaixo. Finalmente, o desfile das viaturas dos bombeiros, com as sirenes estridentes e estrondosas todas ligadas. Bummm! Bummm! Trrr! Patammm! Tinóni! Uiuuuuu! Tinóni!... Demasiada agitação para uma única manhã, não?

Pauleta

“Não temos medo de ninguém.
Se souber um bocadinho da história de Portugal,
verá que Portugal não tem medo de ninguém”

Pauleta, respondendo a um jornalista húngaro in "O Jogo" 06.06.29

28.6.06

Os Pobres Que Paguem a Crise (da Educação)

Desde que me conheço que oiço dizer que o sistema educativo está em crise. E, atendendo ao que tem acontecido e ao que se prevê que aconteça, parece-me que a situação não tenderá, infelizmente, a melhorar. De alguns jornais de hoje, e sem ser exaustivo, veja-se alguns exemplos do "estado das coisas":
Público, p. 5, "Os pais do monstro" (sugestivo título, não?), "Carta ao Director" do leitor Santana-Maia Leonardo: "(...) a actual ministra não manifesta qualquer preocupação com o combate à iliteracia (o verdadeiro insucesso escolar), mas apenas com o insucesso escolar estatístico. Com efeito, as reformas em curso só, aparentemente, se destinam a reforçar o grau de exigência do ensino, porque, na prática, apenas promovem, no ensino público, a mediocridade e o laxismo, forçando um sucesso escolar absolutamente artificial. A não ser que a estratégia do Governo e do PSD para a Educação passe pela criação das escolas de nível: as privadas, destinadas às elites e para aqueles que querem prosseguir os seus estudos, e as públicas para o resto da maralha." (Aconselho vivamente a leitura na íntegra desta carta).
No mesmo jornal, p. 23, "Jornalista da RTP responde à ministra da Educação": "(...) Tenho de concordar que muitas verdades são extremamente difíceis de aceitar e se estivesse no seu lugar também me sentiria abalada com a reportagem "Quando a violência vai à escola" (transmitida pela RTP no dia 30 de Maio de 2006), mas jamais poria em causa o inquestionável e jamais me escudaria num argumento político medíocre e elementar que é, lamentavelmente, dizer que este trabalho não passa de uma criação de uma irresponsável jornalista que não tem mais nada para fazer a não ser "fabricar" casos. (...) "Quando a violência vai à escola" retrata situações de agressividade e de mau comportamento não apenas na escola onde o sistema de vídeo foi instalado, mas também em todas as escolas onde leccionam os professores que aceitaram dar os seus testemunhos (falei com docentes de diferentes escolas como fiz questão de comunicar aos telespectadores). Veja como é de tal forma grave a vivência destes docentes no interior das escolas, que os próprios não aceitaram revelar a sua identidade. Sabe por que o fizeram, não sabe? Acredito que sim. Mas é lamentável que assim seja, não acha senhora ministra? Eu acho. É sinal de que algo não está bem, e não é manipulação." (Aconselho, também vivamente, a leitura integral desta resposta).

Salto agora para a página de opinião do Diário de Notícias, para vos transcrever parte do artigo de Vasco Graça Moura sobre esta temática da "indisciplina escolar" e da "situação explosiva no ensino" que, segundo o articulista, tem solução no recurso ao "politicamente incorrecto": "Se o professor, ou alguém por ele na escola, pudesse dar duas boas chapadas ao jovem agressor, insurrecto e malcriado, o problema resolvia-se em quinze dias. E, se as coisas continuarem assim, virá o tempo em que não haverá outra solução que não seja a restauração das palmatoadas e dos castigos corporais, quer se goste quer não se goste. (...)" (Podem ler na íntegra aqui; e comprem um bom guarda-chuva, porque vão chover as indignações dos politicamente correctos!).
Poderia referir mais matéria para estudo nas edições do Correio da Manhã ou do Jornal de Notícias (neste último caso, há até, logo na 1ª página, um exemplo flagrante de, no mínimo, falta de educação: o Presidente da Câmara de Viseu e da Associação Nacional de Municípios Portugueses pediu à população do concelho para "correr à pedrada" os funcionários do Ministério do Ambiente que andam a fazer o seu trabalho! Zero em comportamento, senhor Presidente!), mas regresso ao Público, mais concretamente ao seu suplemento "Correcção dos exames - Matemática", para terminar com dois breves exemplos.
Primeiro exemplo, p. 3: "Nos últimos seis anos o melhor que os alunos que prestaram provas no exame nacional de Matemática do 12º ano conseguiram foi uma média de 7,7 valores (numa escala de 0 a 20).(...)". (Também merece ser lida na íntegra, esta notícia).
Segundo exemplo, "Comentário à Prova de Matemática B (735)", p. 16: "A prova é muito extensa e apresenta um grau de dificuldade elevado, pricipalmente pela existência da questão 4. Esta questão exige uma resolução analítica que contraria totalmente o espírito do programa. (...)". (A ler integralmente também, este comentário da Direcção da Associação de Professores de Matemática).
Conseguiram chegar aqui? Leram na íntegra? Então, 20 valores para cada um!

Os (pequenos) grandes predadores


Lembram-se dos documentários de Sir David Attenborough sobre a vida selvagem? Eu já não preciso de ligar a televisão, dado que, cá por casa, tenho a vida selvagem a acontecer aqui e agora. Ao vivo e a cores! E estou bem dentro dela! Primeiro plano: a brincar na sala, revolvendo e desarrumando tudo, o Mais Velho afirma que é um leão (um leão, meu Deus! Onde é que eu errei!?...): "Grrrr!" Segundo plano: no banho, o Mais Novo diz, aos gritos, que é um tubarão, batendo, com toda a força, os braços e as pernas - como barbatanas - na água: "Splash! Splash!" (a água derrama-se pelos azulejos e mosaicos da casa-de-banho, transformada em oceano). Plano final: eu. Cá estou, firme, no meu lugar de presa favorita destes dois grandes predadores. Com o corpo (e o espírito!) todo mordido e macerado pelas suas garras afiadas, pelas suas mandíbulas poderosas. Eu: o gnu desta fábula, a raia desta história. Eu, aquele que, dos três, melhor sabe o que a vida, por vezes, é: uma selva.

Post-its Russos

Bolas

Enquanto despacho uma massa chinesa, vejo Humberto Coelho, na SIC Notícias, discorrendo sobre o próximo adversário de Portugal, no Mundial de futebol. "A Inglaterra vai procurar a segunda bola" diz ele. Espero que o árbitro esteja atento a essa eventual ilegalidade. Era só o que faltava, depois da vergonha do jogo com a Holanda!

Eyes Wide Shut

A bola é redonda. Alguém está a ver?

27.6.06

2 + 2 = 4


A história repete-se. Primeiro como tragédia, depois como comédia, ou farsa. Boa notícia do dia: a Espanha foi eliminada. Má notícia do dia: a França apurou-se para os quartos. Vai eliminar o Brasil, após Figo & Companhia eliminarem igualmente a Inglaterra. E, depois de 84 e de 2000, voltamos a encontrar-nos nas meias-finais de uma grande competição. Será altura de acertar as contas.

"Aprender, aprender, aprender sempre!" (Vladimir Ilitch Ulianov)

1) Os Fadistas
Um aluno faz um trabalho de investigação (?), no âmbito da disciplina de História, sobre o pintor José Malhoa (1854-1933). Utiliza, e bem, a internet como fonte de informação (é o tópico na crista da onda: auto-estradas da informação e respectivos choques tecnológicos, etc.). O trabalho consiste, como já adivinharam, numa impressão em papel de um qualquer texto enciclopédico disponível na rede sobre o célebre pintor realista/naturalista, autor do, entre outros, acima reproduzido O Fado. Até aqui nada de novo, acontece todos os dias nas escolas deste país de fado, futebol, touros e Fátima. Deu-se foi o caso do rapaz querer colocar na capa do trabalho uma fotografia do pintor oitocentista. Vai daí e escolhe uma fotografia deste José Malhoa:
O que se pode dizer? Que há mais Malhoas na terra? Ou tanto Malhoa já enjoa?
2) O Exame
Nas duas horas do exame só se ouviu o som das folhas de teste a serem dobradas, um ou outro suspiro, o dedilhar nos teclados das calculadoras. O silêncio é, sem dúvida, uma equação matemática. Uma fórmula química (a do ouro?). Uma experiência física.
3) A Santidade
"O Setôr é um santo!", diz o aluno ao professor, agnóstico e anti-clerical, que lhe deu um bem terreno "10" para ele poder passar de ano.

Mais um tijolo, com um sorriso

Gusev festeja o golo decisivo (3-0) que marcou à Suiça, no desempate com pontapés de grande penalidade.

Agrada-me imaginar a boa disposição de uma mão-cheia de médicos-pedreiros, professores-ladrilhadores, engenheiros-carregadores, músicos-cozinheiros e mais uns quantos novos lisboetas (sim, e portuenses e bracarenses, etc). Como os nossos emigrantes bem sabem, o futebol é um bálsamo para as saudades. Brindemos! (Talvez seja melhor com café, a esta hora...)

26.6.06

Emoção


Há que começar o dia - mesmo não estando no "escritório" -, comentando o jogo, que Scolari classificou de "heróico e maravilhoso". Quanto ao maravilhoso, tenho dúvidas, com tanta pancadaria e faltas absurdas. O heróico parece-me bem. Uma certeza: foi uma ganda joga, daquelas que mexem com a gente por dentro. Agora, ao trabalho, com humildade, para enfrentar o cliente seguinte.

25.6.06

Rugidos de Salão

Creio que é justo assinalar as novas conquistas de um clube simpático.

TPC (em desenvolvimento)

Um par de violino não é um casal com um stradivarius. É um modo de bandarilhar (e dar de novo?).

Os Nihilistas


Os meus filhos, depois de inventarem mais uma qualquer asneira (baterem um no outro, riscarem as paredes da casa, etc., etc.), quando confrontados com as traumáticas perguntas "O que é que estavas a fazer?" ou "O que é que fizeste?", repondem sempre: "Nada." Nada!? O nihilismo é a corrente filosófica com a qual se identificam? Também eles andarão a ler Nietzsche? A descobrir Cioran?

Afinal, o tamanho conta!

Nem demasiado grande, como em A Bigger Splash...



... nem demasiado pequeno, como em A Little Splash...


... apenas The Splash!

Os Meus Investimentos No Mercado da Arte

Por momentos, pensei que estava rico. Mas foi um mergulho na água fria!

Conflito de Gerações

O mais velho, no banho, cobre a cara com espuma e diz: "Sou velho, tenho barbas brancas!" O mais novo, que nunca se fica atrás, logo riposta, batendo com os pés na água e afirmando que tem quase 4 anos, e que já é grande. Eu, que sou o mais alto dos três (lá virá o dia em que, provavelmente, a situação se inverterá!), desejo, como sempre, o contrário do que eles querem: que não crescessem nunca! Mas, também como sempre, os meus desejos estão condenados a nunca se realizarem.

O fiel jardineiro


Percebem agora pq não posso achar piada a certas touradas ...
Acabei de ver "O fiel jardineiro" ...
Gostei bastante!

Martin Adler

Perante factos como o assassinato brutal de um homem pelas costas quase tudo na nossa vida parece "insignificante" (e frívolo). Mas, se olharmos de outro modo, talvez possamos compreender como o "insignificante" pode ganhar uma importância decisiva. Aquilo que é um dado adquirido para muitos de nós (a liberdade e a democracia, mais ou menos imperfeitas; o relativo conforto material; o acesso à cultura e à educação; o direito ao trabalho, etc.) não passa de um sonho para milhões de outros como nós. E saber isto não é "insignificante".

Ginástica & Metereologia

Reparem na elegância da impulsão no ataque ao "aparelho"; no movimento de elevação da perna direita; na flexão em arco do braço do mesmo lado. Nota técnica: 10. Nota artística: 10. Futuro "medalha de ouro olímpica em ginástica desportiva"!
(Os raios solares atravessavam, entretanto, o filtro das nuvens do fim da tarde...).

A Última Grande Reportagem

Num momento em que temos a ilusão de que o mundo está todo ao alcance de um click, as fotografias e os textos de Martin Adler, assassinado, a tiro, pelas costas, na Somália, servem (entre muitas outras coisas) para mostrar/lembrar a importância do trabalho de um Repórter. É que há mais mundo para além da Internet. Um exemplo de profissionalismo e coragem.


24.6.06

No Tentadero do Cabo da Lezíria

Sim, há uma certa beleza no bailado de um novilheiro, sacudindo a muleta no último instante e girando depois o corpo, delgado e orgulhoso, atirando um sorriso de triunfo às raparigas, penduradas nas bancadas. É também num bailado, mais difícil de compreender, que ele corre pela areia, de ligeiras meias rosa e rasas sapatilhas pretas, cravando, no momento decisivo, o par de bandarilhas no dorso do animal.

Não, não é possível entender como o picador espeta a vara no bicho, tingindo-lhe de vermelho vivo o dorso negro, enquanto os marialvas arrotam cerveja e comentam a faena. Dizem-me que é para “tirar nobreza ao toiro”, para o tércio da muleta. “Aos que têm mais pata” dá-se-lhes “mais de uma varada”.

Quando é possível, no código da festa, o bailado do homem do traje de luces não dispensa o adereço de torneio medieval. Porque será que, tantas vezes, a beleza tem uma face sombria?

A propósito de qualquer coisa ...

Censura é o uso pelo estado ou grupo de poder, no sentido de controlar e impedir a liberdade de expressão. A censura criminaliza certas acções de comunicação, ou até a tentativa de exercer essa comunicação. No sentido moderno, a censura consiste em qualquer tentativa de suprimir informação, opiniões e até formas de expressão, como certas facetas da arte.

O propósito da censura está na manutenção do status quo, evitando alterações de pensamento num determinado grupo e a consequente vontade mudança. Desta forma, a censura é muito vulgar entre certos grupos, como certas religiões, multi-nacionais e governos, como forma de manter o poder. A censura procura também evitar que certos conflitos e discussões se estabeleçam.

A censura pode ser explicita, no caso de estar prevista na lei, proibindo a informação de ser publicada ou acessível, após ter sido analisada previamente por uma entidade censora que avalia se a informação pode ou não ser publicada (como sucedeu na ditadura portuguesa através da PIDE) , ou pode tomar a forma de intimidação governamental ou popular, onde as pessoas têm receio de expressar ou mostrar apoio a certas opiniões, com medo de represálias pessoais e profissionais e até ostracismo, como sucedeu nos Estados Unidos da América com o chamado período do McCartismo .

Pode também a censura ser entendida como a supressão de certos pontos de vista e opiniões divergentes, através da propaganda, manipulação dos média ou contra-informação. Estes métodos tendem a influenciar e manipular a opinião pública de forma a evitar que outras ideias, que não as predominantes ou dominantes tenham receptividade.

Uma forma moderna de censura prende-se com o acesso aos meios de comunicação e também com as entidades reguladoras (que atribuem alvarás de rádio e televisão), ou com critérios editoriais discricionários (em que por exemplo um jornal não publica uma determinada notícia).

Muitas vezes a censura se justifica em termos de proteção do público, mas na verdade esconde uma posição que submete os artistas ao poder do estado e infantiliza o público, considerado como incapaz de pensar por si próprio.

Actualmente a censura pode ser contornada mais eficazmente, com o recurso à Internet, graças ao fácil acesso a dados sem fronteira geográficas e descentralizado e aos sistemas de partilha de ficheiros peer-to-peer, como a Freenet.

O uso cotidiano da censura promove um movimento de defesa bastante corrosivo que é a auto-censura, quando os produtores culturais e formadores de opinião evitam tratar de questões conflitivas e divergentes.

in Wikipedia

23.6.06

Deste Lado do Espelho

O homem olha-se no espelho e acaricia o queixo com a lâmina.

O pior é este meio-termo, nem bem nem mal passado, a que falta paixão, arrebatadora. Sem ela, os dias – e a pele – ficam macilentos. Paixão por alguém, por uma missão, por um trabalho, não interessa por quê ou por quem. Paixão. Incêndio descontrolado, mal-comportado, desarrumado, imprevisível, escandaloso.

Passa a cara por água fria e volta a olhar-se no espelho.

A Leste do Paraíso!


Ontem, foi a Sérvia-Montenegro a confirmar a sua desagregação (duas grandes penalidades provocadas pelo mesmo defesa: dois tiros nas mãos!). Hoje, a República Checa e a Croácia triplicaram o desastre das selecções que nasceram depois da Queda do Muro. Resta a Ucrânia, que disputa amanhã um lugar nos oitavos-de-final. Ultrapassará a cortina de ferro tunisina? Questão que muitos novos lisboetas (e portuenses, bracarenses, etc.) esperam ver resolvida a seu contento.

22.6.06

Blogues e Memórias de Papel

Pacheco Pereira regressa hoje ao assunto, desta vez explicando porque é que textos antigos, fragmentados, podiam e deviam ganhar novos sentidos na blogosfera. Refere Camus, Valery e Cioran que resolvo perseguir (descobrir) em hipertexto [tanto para ler, tão pouco tempo!]. No artigo do Público, JPP lembra que "a leitura num écrã raras vezes anda para trás, tende a andar para o lado antes de andar para a frente", ganhando em "espessura". Volto a saltar do écrã para o papel. Sou cliente (cada vez mais) regular desta revista. "Como se avalia um professor?" é, na edição desta semana, o tema de capa e de um dossier que inclui uma entrevista com a ministra Maria de Lurdes Rodrigues [posso levar, sim senhor, no caso de não terem comprado...]. Umas páginas adiante, Rosa Ruela entrevista "O Fazedor de Histórias" que, depois de amanhã, vai receber o Grande Prémio de Romance e Novela da APE - 2005. O amigo Francisco lembra como, na juventude vivida em Chaves, tinha "um grupo que fazia umas edições policopiadas, os Cadernos do Largo das Freiras" que enviavam para Lisboa, ao cuidado do Bookcionário de Assis Pacheco, n'O Jornal. A certa altura, recorda ele, "tornei-me uma celebridade na minha mesa de café só porque ele citou um poema meu...". Um blogue do Assis Pacheco também devia ser (muito) interessante.

E o que a malta se divertia, com as fotocópias, na nossa mesa de café?

Manhã Submersa 4 (fábula)

Lembram-se deste trapezista?
E deste?

Pois bem, temos novidades sobre eles: 3ª-feira à tarde, aula (suplementar) de Literatura Portuguesa (últimos retoques para o exame). Enquanto comentamos Manhã Submersa de Vergílio Ferreira e a dialéctica da liberdade / opressão desenvolvida no romance, damos conta de que um destes artistas anda a esvoaçar no interior do 2º piso do Pavilhão onde nos encontramos. Não sabemos como entrou, nem podemos abrir as janelas-postigos, que são inacessíveis sem uma escada "desdobrável". Em pânico, o bicho voa de postigo para postigo, embatendo nos vidros, em movimentos cegos. Aflitivo! E, pormenor incrível, do lado de fora, há um outro pardal (irmão? macho? fêmea?) que segue os movimentos do primeiro e vem bater nos mesmos pontos em que este embate no interior. Acreditam!? Parece uma daquelas cenas de filme de prisão: o prisioneiro e a visita comunicam, tendo um vidro inquebrável, anti-som, no meio, mas em-versão-pardal! Como terminou a aventura? Um funcionário e uma escada foram suficientes. Janelas-postigos abertas e o caramelo lá encontrou maneira de dar às asas, em espaços mais vastos e próprios. Como em Rumble Fish, lembram-se? Uma dança louca de liberdade. É então que respiramos fundo e voltamos ao romance vergiliano, agora todos muito melhor preparados para entender como a luta pela liberdade e pela dignidade, esse "apelo invencível de vida e de harmonia" (p. 217, 13ª edição), é dura e difícil. Mas necessária. Sempre, cada vez mais.

O que farei quando tudo arde

O que farei quando tudo arde ...
não sei se conhecem este blog ...


Pedagogia da Tanga

Notícia de uma importante iniciativa, em prol de um futuro melhor. Claro que podiam sempre fazer do país a bandeira mas isso dá um bocado mais de trabalho.
Lisboa, 20 Jun (Lusa) - A Assembleia Municipal de Lisboa (AML) aprovou hoje uma recomendaçäo do PSD, com a abstençäo de todos os restantes partidos, que pede à autarquia que promova a retirada do espaço público das bandeiras nacionais com publicidade.
A recomendaçäo aprovada esta tarde pelo PSD, que tem maioria na AML, sustenta que "algumas empresas têm vindo a tirar algum aproveitamento deste patriotismo genuíno, imprimindo na bandeira nacional o nome das suas marcas", durante a participaçäo da selecção portuguesa no campeonato mundial de futebol na Alemanha.
Sublinhando que a bandeira nacional é "o símbolo máximo da naçäo, protegido por lei", a AML recomenda à autarquia que, "numa perspectiva pedagógica mova os meios possíveis para que sejam removidas todas as bandeiras nacionais expostas em espaço público que tenham qualquer mençäo a marcas, produtos, bens e serviços".
"A marca nacional estar confundida com uma marca comercial é um desaforo. A Assembleia Municipal tem de manifestar o seu repúdio", defendeu o deputado social-democrata Vítor Gonçalves.
Para o CDS-PP, o importante é "respeitar o símbolo, mas sem fundamentalismos, garantindo-se a afectividade do povo em relaçäo a ele".
Segundo a associaçäo de defesa dos consumidores (DECO), a publicidade que até agora tem sido colada às bandeiras näo viola a lei da publicidade.
No entanto, o anteprojecto do Código do Consumidor, que se encontra em discussäo pública, prevê a proibiçäo de utilizaçäo de publicidade em símbolos nacionais como a bandeira e o hino, como tem sucedido nos últimos dias a propósito do Mundial de Futebol.

Há mais Mundo para além do Mundial


Lembram-se do "banho de sangue" na Casa Pessoa? Parece que é necessário levar o pelotão de fuzilamento às terras de Racine, Voltaire & Companhia! (E, vai-se a ver, a França nem se apura para os oitavos!).

21.6.06

20.6.06

Jogo Falado (de José Marinho a José Mourinho, e vice-versa)


Nisto do futebol, como em quase tudo na vida, não se pode agradar a gregos e a troianos. Comentando os comentadores televisivos dos jogos de futebol, um dia destes, na Sala de Professores, no intervalo das reuniões de avaliação do final do ano lectivo, os colegas de Educação Física presentes criticaram severamente o estilo do José Marinho. Porquê? Porque se farta de usar, no seu discurso, imagens e metáforas que não têm nenhuma relação com o jogo em si. Uma linguagem amadora, poética (que pecado!), entusiasmada, subjectiva, nada técnica. Entendo, mas estou em completo desacordo. Eu vibro com o futebol por causa da sua extraordinária dose de imprevisibilidade, beleza e genialidade, tanto individual como colectiva. Não por causa dos aspectos técnicos ou dos esquemas tácticos, ou do estafado 4-4-2, ou do incongruente 3-1-5-1, ou o diabo a sete. Por isso me divirto tanto com aquilo que irrita os meus colegas de Educação Física, grandes admiradores de José Mourinho: os comentários excêntricos do José Marinho (de resto, parece-me que o estilo cerebral, rigoroso e matemático de Mourinho não prescinde das noções de imprevisibilidade e de imponderabilidade e equilibra, nessa medida, uma dimensão psicológica com a dimensão técnica em sentido estrito). Que pensarão os meus colegas de Educação Física dos comentários do Inglaterra - Suécia de hoje à noite? Um jogo repartido (uma parte dominada por cada uma das equipas) e, logicamente, empatado no final: 2 - 2. Eis a síntese sugestiva, em jeito de remate final, do supra-referido Marinho: "Uma primeira parte para inglês ver; e uma segunda parte que foi uma grande suecada!" A muitas milhas, portanto, da grande seca(da) dos experts que não se calam durante o jogo, e cujas invenções mais notáveis são a "pressão alta" e o "vértice do triângulo". Quanto a mim, chega de lições de física e de geometria. Não é pela poesia (épica!) que sabemos dos gregos e dos troianos? É claro que sim! Então venham de lá essas estrofes, José!

Português B

O inspector Ponto e Vírgula segurou Epífora pelo colarinho e entrou de rompante no gabinete. “Ei-la, sra. ministra!” rosnou na direcção da secretária. “Tem a certeza que é a agitadora?” questionou a responsável, recostando-se na cadeira. “Positivo, positivo!”, retorquiu o inspector, abrindo as pernas, num jeito marcial e logo acrescentando: “Quer ver?”. A ministra acenou com a cabeça e Ponto e Vírgula pontapeou Epífora na dobra do joelho direito, fazendo-a tombar na alcatifa grená. “Não te faças de santinha!” avisou, com voz de autoridade. “A puta que te pariu!” respondeu-lhe, numa figura de estilo pouco imaginativa mas quase sempre eficaz. A mão pesada de Ponto e Vírgula cortou o ar e acertou uma sonora galheta sobre a orelha direita da detida, que desabou aos pés da secretária, desatando num berreiro: “Ministra para a rua! Ministra para a rua! Ministra para a rua!”. Do outro lado da secretária, a ministra fez um gesto de enfado e, girando na cadeira em direcção à janela, disse secamente: “Pode levá-la!”. Ponto e Vírgula ergueu Epífora por um braço, torcendo-o de seguida, atrás das costas, e empurrou-a para a porta, por onde espreitava o agente Parágrafo. “Não fiques aí especado, com cara de pleonasmo, pá! Traz o carro para a porta lateral, que temos que pôr esta a conjugar aos quadradinhos!”

Os Portugueses


Há 3 tipos de portugueses: os que vão ver o jogo de amanhã porque querem e podem; os que não vão ver o jogo porque não querem e os que não vão ver o jogo porque não podem. Eu estou no último grupo: enquanto a selecção estiver a defender as cores da nação em Gelsenkirchen, terei o prazer de estar a servir o país no meu local de trabalho. Mas, por favor, não me venham com a filosofia do trabalho e do cognac... Para isso, já bastam os deputados!

19.6.06

O Senhor (Rui) Tavares


O Público dos sábados costumava valer pelo "Mil Folhas" que, às vezes, calha valer por uma ou outra recensão, sugestão de leitura ou entrevista da Alexandra Prado Coelho (que, imaginem, faz de Carolina no Manhã Submersa do Lauro António!?). Agora passou a valer muito mais. Por causa das crónicas brilhantes do, "pobre e mal agradecido", Rui Tavares. A desta semana, por exemplo, sobre o Pacheco Pereira como "mãe de Bragança" cheio de ciúmes da atenção mediática dada ao futebol e ao Mundial, é impagável. A frase certeira, o raciocínio acerado, o estilo simples e plástico, mas refinado, evidentemente erudito e perpassado de ironia, fazem do novel cronista um caso à parte no panorama dos colunistas que eu conheço. E, pormenor importante, é de esquerda! Dele, já li o "insolente", "polémico", "delirante", em suma, extravagante livro que dá nome ao seu blogue (há, talvez gostes de saber, J., um texto sobre alguns romances do "Senhor Murakami"...); estou, agora, a meio d' O Pequeno Livro do Grande Terramoto, merecedor, com efeito, de todos os elogios que recebeu o ano passado. Só para dar um exemplo da excelência desta prosa:

"Diz-se que trinta segundos de abalo sísmico parecem, à pessoa que os vive, intermináveis. Mas vieram trinta segundos e passaram trinta segundos, e mais trinta e mais trinta. A determinada altura o abalo deteve-se por um pouco, permitindo uma certa respiração aos lisboetas. Mas esta interrupção, e mesmo uma segunda, duraram apenas alguns segundos. O regresso dos abalos era mais forte ainda e a reacção das pessoas, que no primeiro embate parece ter sido mais de espanto, deve ter passado rapidamente ao pânico. O que se passava afinal? Os sismos fortes em Lisboa não eram tão comuns que permitissem a uma geração ter disso memória recente. Havia, evidentemente, uma reminiscência colectiva do terramoto de 1531 - o outro grande terramoto de Lisboa -, mas 1531 estava a uma distância quase tão grande como a que nos separa de 1755." (pp. 75/76)

Captação do pormenor significativo. Olhar objectivo e subjectivo sobre os acontecimentos. Oscilação entre a referência individual e a colectiva. A relação do passado com o nosso presente. Etc. E assim se descobre mais um autor (de resto, os Tavares, Rui ou Gonçalo M., estão em alta no panorama literário português!). Que nos afasta do futebol (não vi de novo a Espanha...) sem precisar de dizer mal dele. Basta ter talento e escrever com um prazer tão evidente que é difícil resistir-lhe. Bola ao centro. Entrem no jogo. E aproveitem!

Última Entrada (na água!)

David Hockney, Splash

A Leitura


Na manhã ofuscada, um falcão sobrevoou tudo isto. Agora que a tarde se vai demorando, os sons de fundo são os tiros das caçadeiras. Predadores e presas uns dos outros, e de si mesmos. A luz corta a direito, por entre os ramos altos dos pinheiros. Como se chamam as outras árvores? E os pássaros escondidos nelas? Os insectos que zumbem? Tento pôr a leitura dos jornais em dia, mas o vento não deixa. Levanta as folhas, dobra-as, empurra-as largamente das minhas mãos. Obriga-me a levantar os olhos das letras e a olhar, com toda a atenção, o livro cheio de vocábulos verdes, azuis e cinzentos que se abre aqui, agora, à minha frente. Saberei, de facto, ler?

David Hockney's Way

À Maneira de David Hockney (3ª entrada)

À Maneira de David Hockney (2ª entrada)

À Maneira de David Hockney (1ª entrada)

Moldura Humana

O GRITO

A mulher tem vestido um casaco de fato de treino com as cores da bandeira de Portugal. O tecido do tronco é vermelho, os braços verdes e o capuz amarelo. Mas não há aqui motivo para festa. A mulher tem a boca e as narinas muito abertas e, na ponta do braço direito em riste, o punho fechado, à excepção do indicador que sublinha a indignação. Tem o corpo, que parece franzino, ligeiramente inclinado para a direita (visto daqui, do lado de quem segura o jornal: DN, sábado, 17 de Julho de 2006, secção Sociedade, página19).

A foto, de Pedro Ferrari – Lusa, ilustra a notícia que leva por título “Avó e pai de Vanessa condenados a 18 e 14 anos e nove meses de prisão”. Para legenda, os editores do jornal escolheram a seguinte frase: “Afluência – Mais uma vez os moradores estiveram em peso na sala de audiências do Tribunal de S. João Novo para assistir à condenação dos seus antigos vizinhos”.

Do lado esquerdo da mulher com o casaco-bandeira (ainda na perspectiva do leitor) está uma mulher gorda, a quem uma blusa de alças com riscas horizontais faz ainda mais gorda. Também tem a boca aberta mas num jeito de falta de ar, olhos cravados na lente do fotógrafo. Do outro lado da mulher-bandeira está uma mulher mais nova com uma camisola igualmente às riscas a deixar surgir a barriga, logo acima dos jeans. Tem a cabeça de lado, a boca aberta, deixando ver a fileira dos dentes de baixo. Os olhos estão fechados e o braço direito ligeiramente erguido acima da cabeça, de modos que parece dançar. A fechar o friso principal da indignação, outra mulher larga, com uma blusa preta de manga curta e um fio dourado com duas medalhas a pular, imóveis, sobre o peito XXXL. Também tem a boca escancarada, num esforço que lhe enruga a testa, mas os olhos estão cravados na mulher-bandeira, como quem grita ao desafio.

Em segundo plano há outras pessoas, homens e mulheres. Um aponta, outro sorri, aquela faz uma careta misteriosa, mais sorrisos, lá no fundo. Espectadores, participantes numa novela da vida real, “moradores em peso” para assistir e comentar. Acredito que alguns, de forma genuína, queiram demonstrar público repúdio pela morte da criança. Estou convencido que outros teriam optado pela final do “Dança Comigo”, no Campo Pequeno, se pudessem escolher.

Sobram os gritos, aqui num silêncio de papel, e algumas perguntas, em rodapé. Porque gritamos nós? O que nos faz expulsar o ar com tal ribombância de cordas vocais? Qual foi a última vez que gritaste, a plenos pulmões? Porquê?

18.6.06

Vai desejar factura?

De vez em quando, numa volta a gavetas e velhas pastas e fundos de armários, enche-se um saco, dos grandes, de papel para reciclagem. Facturações detalhadas como poucas outras coisas no nosso quotidiano, fotocópias de artigos muito interessantes que vão perdendo o interesse na proporção inversa do pó, folhetos de espectáculos que sairam definitivamente de cena, free postcards com piada fora de prazo, etc. Na triagem, os papéis condenados formam uma pilha e os papéis com interesse formam outra. A primeira pilha costuma ser bastante maior do que a segunda que, por sua vez, é o embrião de uma nova coluna de papel que será vistoriada dentro de semanas, meses ou, nalguns casos limite, anos depois.

O essencial da nossa vida não se pode rasgar em tiras finas e voltar a rasgar em quadrados minúsculos. E, não, não estou a falar de memória RAM.

17.6.06

enganei-meeaindabem!

enganei-meeaindabem!

Jarhead

7 em 10 possíveis ...
Uma vez mais gostei/gostamos do trabalho do Jake Gyllenhaal ...

16.6.06

Força,

Angola!

A adidas mata para se darem uns pontapés


Aqui!

Bar


Não sei se conhecem mas vale a pena ver ...

A Tempestade

No intervalo da chuva de golos argentinos (3 a 0), saímos para as compras de fim-de-semana. Assim que nos encontramos na estrada, somos apanhados por uma forte "tromba d'água" (bela expressão!), que inunda tudo. Os relâmpagos e os trovões rebentam logo por cima de nós ("Ai, Santa Bárbara!"). Alguns carros encostam à berma, com os piscas ligados. "Quem anda à chuva, molha-se". Mas nós avançamos, cautelosamente. Só queremos chegar ao Centro Comercial mais próximo, visto, com surpresa nossa, como um porto de abrigo. Conseguimos. Mas nem chegamos a entrar, porque está toda a gente a sair: os canos deram de si e há água por todo o lado. No átrio, dentro das lojas do primeiro piso, no Continente fechado. Voltamos, portanto, para trás, notando, com alívio, que entretanto a chuva acalmou. Sim, "depois da tempestade, a bonança", que permite a redacção deste post. Mas eis, também, como as forças da natureza nos dão, de quando em quando, lições de humildade. Seremos capazes de as aprender? Falando de forças da natureza: os servo-montenegrinos sentiram-nas bem fundo na carne. Resultado final - Argentina: 6 / Sérvia-Montenegro: 0. Pois, "quem semeia ventos, colhe tempestades!".

Fotografia Ligeiramente Desfocada Na Terra Do Nunca

Ela diz que ele lhe faz ver, regularmente, que “a vida não é um conto de fadas”. Acrescenta que isso lhe faz bem. Eu penso que gostava que ela tivesse umas asas pequeninas, transparentes, como a Sininho do Peter Pan. Mas não lhe digo porque também sei que as fadas só existem no nosso desejo de felicidade.

15.6.06

O Abismo


No ecrã do blogue, a imagem cobre (esconde) a listagem dos últimos posts (em cima, à direita). Então temos de voltar atrás, para a editar de novo, dando-lhe a forma (o tamanho, a dimensão) adequada. Mas o tempo passou e, em vez de andarmos para trás, fomos em frente. Podia ser uma definição do presente: mesmo os passos à rectaguarda são passos em frente. E, claro, quem avança, recuando, não pode ver onde põe os pés... Tropeçar é um verbo que se declina apenas no presente?

Bolas de Granizo

Alguns cromos do dia.

Os céus castigaram as uvas no Alto Douro. Dois portugueses carregaram um buda de 95 quilos até à Alemanha, para a festa do futebol. Os trabalhadores da Opel gostavam de jogar até à final. Sócrates, em Bruxelas, diz que só fala da Europa. Golo?

O Intervalo


O que é a actualidade? Se calhar estamos sempre no intervalo, entre qualquer coisa que aconteceu e outra que vai acontecer. Estamos aí, meio perdidos, no meio, na deriva, deste dia para aquele. A C. diz-me, no fim da tarde: "Parece que hoje é domingo." Pois parece. Mas não é. Um céu de chumbo, com abertas por instantes. Entre um lugar e outro, no mesmo sítio. O eterno retorno do que perdemos a cada momento. Pacheco Pereira fala disso, hoje, no Público, a propósito disto: dos blogues como "apoteose do presente". Mas o que é o presente? É quando os ponteiros se sobrepõem?

- Fala Charitos.

O Corpo de Deus passa-me ao lado mas sempre é um feriado. Resolvo fazer vista grossa a uma papelada à espera de ordem e outros afazeres e aproveito a folga. Depois do almoço, M. sai para cumprir compromissos familiares e eu estico-me no sofá, com um livro novo. Os cadáveres sucedem-se, num mapa que o inspector Kostas Charitos acabará por decifrar nas últimas páginas, que devorei há pouco. A capa portuguesa é fraquinha mas o recheio deste primeiro romance de Petros Markaris é um divertimento muito recomendável.

Opção Editorial

Não é a actualidade que me interessa. É o intervalo entre as notícias. Uma espécie de abismo de sentidos.

14.6.06

Uma Pergunta Redonda

Será que é desta que a Espanha passa dos quartos-de-final?

(Ainda) O Presidente & Os Símbolos

Uma pergunta, a propósito da irritação do amigo PB (e da nossa) com os políticos. Será que "o menino da G3", um cravo abstencionista, é que estará certo, no seu alheamento? Não creio que seja esse o caminho mas também não me parece que um voto, de quatro em quatro anos, seja suficiente como acção. (À atenção do SIS e quejandos: não, ainda não estou a pensar na via das armas...)

"Entre os homenageados pela Presidência da República, na cerimónia de ontem em Serralves, estava Diogo Bandeira Freire: o menino que, em 1974, aparece a meter um cravo numa G3. Uma imagem da Revolução de Abril que perdura na memória de muitos. O menino, ícone de Abril, emigrou há 18 anos para Inglaterra, onde agora é director financeiro numa empresa de distribuição. E, para espanto de muita gente, pertence ao partido dos abstencionistas: tem 35 anos e nunca votou, nem em Portugal, nem nas municipais em Inglaterra. Dos políticos portugueses, Diogo Bandeira Freire, que promete repensar a sua atitude nos actos eleitorais, apenas destaca um, precisamente o que o convidou a participar pela primeira vez no Dia de Portugal."

Diário de Notícias, 10.06.2006

Aqui encontram uma entrevista, feita há dois anos, onde o menino do cravo diz, entre outras coisas, que "é um bocado irónico que o miúdo, o símbolo de Abril, tenha saído do país".

Manhã Submersa 3


Depois de tanto calor, os dias começaram a ficar mais frescos, cinzentos. Tudo culminou de madrugada: trovões, relâmpagos, fortes cargas de água. A C. acordou, ficou assustada. De manhã, diz-me que não se lembra de coisa assim nos últimos anos. Eu digo-lhe que exagera, que tem fraca memória. Os planos de fim-de-semana parecem ir por água abaixo, o que é pena. Vamos esperar por melhorias... Mas eu que gosto tanto das chuvas de Verão!

Manhã Submersa 2


Aula de Literatura Portuguesa, ontem à tarde. Visionamento do filme, Manhã Submersa (1980), de Lauro António, a partir do romance homónimo de Vergílio Ferreira. Como já acontecera em outra ocasiões, os rapazes e as raparigas dividem-se completamente na sala: elas para a esquerda, eles para a direita. O que diria o narrador, o António Santos Lopes, o Borralho, disto? O filme sublinha, de forma clara, a ideia da repressão da sexualidade dos jovens seminaristas. E, como seria de esperar, os jovens alunos de hoje, mesmo não (tão?) reprimidos, são muitíssimo sensíveis a este ponto do filme (também do romance, mas as imagens são, claro, mais imediatas que as palavras...). Cenas mais apreciadas? Três: pela sua dimensão dramática, a elipse final, da auto-mutilação do protagonista; e duas cenas de natureza sexual: o Dr. Alberto com Carolina, a criada, vistos de relance, pela porta entreaberta; e a cena entre a mesma Carolina e António, na cozinha, quando o rapaz espreita os seios da jovem mulher enquanto come a sopa. É então que ela pergunta, em jeito de troça "- Já te apetecia, não?". Sim, foi a frase mais repetida, por entre risos e gargalhadas, no átrio da escola, logo após a aula. Por eles e por elas. Nisto não houve separações, nem divisões para a esquerda e para a direita. Estavam todos misturados... E, pelos vistos, alguma coisa decoraram do romance...

Manhã Submersa 1


Literatura Portuguesa. Ficção contemporânea: Manhã Submersa, de Vergílio Ferreira (1955). Uma história de aprendizagem, narrada na perspectiva de um rapaz de 12 / 13 anos, o António Santos Lopes, o Borralho (uma espécie de projecção das vivências do próprio Vergílio Ferreira). O romance denuncia, a partir de uma experiência de Seminário, a contradição entre os valores e as práticas religiosas e clericais na província, atrasada e conservadora, dos anos 30 / 40 portugueses (quando o elogio abstracto do amor cristão se manifesta na prática quotidiana como violência concreta sobre os seminaristas). Há ainda a denúncia da opressão que uma instituição rígida, com as suas regras e hierarquias, exerce sobre o indivíduo, especialmente fragilizado porque criança ou adolescente. Pode ler-se, aqui, claro, uma denúncia política mais vasta, do Estado Novo salazarista, de que o Seminário é a maqueta ou o microcosmos. Mas o romance mostra também como a liberdade e a libertação são possíveis, ainda que com custos elevados (o sacrifício da auto-mutilação final do protagonista). Aliás, a existência do romance é a melhor prova de sobrevivência que se pode apresentar: ele foi escrito por alguém (António / Vergílio Ferreira) que sobreviveu para contar a história. Um romance excepcional, do melhor que o autor escreveu (portanto, do melhor que a literatura portuguesa pode apresentar). Pelo que este post é um convite à leitura. A história (não o romance...) começa assim: "Tomei o comboio na estação de Castanheira..." Dispostos para a viagem?