22.5.06

Fins-de-Semana Com Todos

Houve uma altura da minha vida em que os fins-de-semana eram o ponto mais calmo e tranquilo da semana. Isso foi antes do aparecimento da prole. Eu ansiava pela chegada dos sábados (e domingos), passando as agruras das 6ª feiras com um ar de homem feliz e completo. Claro, estavam a chegar os dois dias das saídas "à noite", dos passeios com a amada, das idas ao cinema, da leitura dos jornais atrasados, da maravilha de não ter de me deitar cedo, nem de me levantar, com as galinhas, ao toque infernal do despertador. Foi um belo tempo, este, mas passou. Agora os fins-de-semana têm outras prioridades. E outros protagonistas, num filme em que eu e C. passámos, é a verdade, a actores secundários. Basicamente, trata-se de um filme excessivamente animado, o que está longe de, depois de uma semana de trabalho cansativo e exigente, ser um dado agradável.
Vejamos. Tudo começa com as tarefas de sábado de manhã, repartidas por pai e mãe: passar o pano do pó, aspirar, fazer almoço e sopas para a semana, limpar casas-de-banho, vidros e espelhos, estender roupa, fazer camas de lavado, passar a ferro, etc., tudo isto em simultâneo com a necessidade de acompanhar e orientar os trabalhos de casa do Filho Mais Velho e dar um mínimo de atenção ao Filho Mais Novo, que, como calculam, dá mostras de que existe praticando todo o catálogo das piores asneiras & disparates possíveis, próprios de uma criança de 3 a caminho dos 4 anos. Para arrasar os nervos, é uma receita infalível, que continua sábado dentro, quero dizer, sábado fora, porque ficar em casa é uma opção péssima, só aconselhável no caso de filhos calmos ou mesmo muito calmos (existem?) ou pais com tendências evidentemente masoquistas. Portanto, sair não é uma escolha: é uma forma de sobreviver ao caos. E quem diz sábado, diz domingo. Dia diferente, mais do mesmo. Até ao ponto de desejarmos que chegue depressa a 2ª feira. Não por sermos viciados em trabalho, mas por os rapazes serem distribuídos, por umas horas, pelos respectivos estabelecimento de ensino. E descansarmos, portanto, um pouco deles, frase politicamente incorrecta, mas sentida e com sentido.
Aos fins-de-semana, à excepção de um ou outro desvio à norma (é quando os avós entram em acção), os filhos são os reis e nós os seus servos-da-gleba, embora pareça o contrário. Nós tomamos as decisões, mas são eles que nos forçam a elas. Essa é a principal novidade dos nossos actuais fins-de-semana: tudo depende da dinâmica intrínseca (gostaram desta?) que eles criam inesgotavelmente entre si e que nos afecta a todos. Se, antes deles, os fins-de-semana significavam repouso, agora significam barulho e confusão. Se significavam deitar tarde e dormir até os músculos doerem, agora significam na mesma deitar tarde (embora não tão tarde!) e levantar cedo, porque, adivinharam, eles se levantam bem cedo. Em suma, se os fins-de-semana significavam dispor do nosso tempo como nos aprouvesse, agora significam viver em função do tempo e do ritmo deles. E, pelo que me vou apercebendo, ouvindo colegas e conhecidos, nós não somos a excepção. Somos parte da regra.
Assim se passam os nossos actuais fins-de-semana: para evitarmos que a rapaziada fique horas especada em casa em frente ao televisor (mas, às vezes, é inevitável... e um descanso momentâneo!) ou a lutarem um com o outro das formas mais histéricas e irritantes, aí estamos nós na rua, no jardim, no parque, nas imediações do novo Centro de Estágio do Benfica, no Centro Comercial, no passeio poeirento da Costa, etc. Pode parecer que são soluções bem agradáveis, sempre são melhores do que ficar em casa a ler, ou a ver um filme do Woody Allen na televisão, ou conversar calmamente, preguiçosamente deitados no sofá. Pode parecer, mas não são. Porque saímos quando nos apetece ficar. Porque a palavra silêncio, ou a palavra sossego já são só, para nós, palavras nocturnas. Quando eles dormem como anjos, que é o que são. Porque, claro, tudo isto não passa de um conjunto de desabafos de pais cansados, mas babosos. Eles mudaram os nossos fins-de-semana, as nossas semanas, os nossos meses e anos. Mudaram as nossas vidas. Mas, para nós, isso é tudo. Eles são tudo. É por isso que escrevo este texto. Porque passou mais um fim-de-semana (cansativo e maravilhoso). E eu já estou ansioso pela chegada do próximo, para poder sair com eles. Levá-los pela mão, jogarmos à bola, andarmos de bicicleta. E dizermos, mais uma vez, um ao outro, depois de novo dia extenuante, que somos uns pais loucamente felizes e afortunados. Pois isto é, de facto, um milagre. Sim, a palavra é mesmo essa. Milagre. E é da natureza dos milagres mudarem as vidas das pessoas, não é?

3 comentários:

PB disse...

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PB disse...

MAS ESPERA! adorei o texto!!! estava a falar de boca cheia ... :-)

PB disse...

DEPOIS levas, vais ver ...