28.4.06

Os dados na areia

- Já comprei os bilhetes.
- O que é que esperas da viagem?
- Sossego. O grau zero do stress. Tempo para pensar. Isolamento. Ausência de referências e solicitações. Um vazio para me espreitar por dentro. Foi por isso que concordei com este destino: parece-me perfeito.
- Hesitaste?
- Claro! Como sempre. Quero ver o mundo, outras cidades, outros países. Pergunto-me sempre: por onde (re)começar, raios? Ruas, cafés, museus, jardins, rios, praças, sons, edifícios, pessoas. Mas, se fosse por aí, continuava a circundar-me, a adiar esta visita interior.
- Vai ser um retiro zen, portanto.
- (Risos) Espero que seja suficientemente tranquilo.
- Não estarás a colocar muito alto a fasquia das expectativas?
- Espero que não. Só quero ser mais genuíno, mais eu. Preciso de entender como é que posso fazer isso. Acho que esta viagem pode ajudar. Lembras-te daquele texto do Vergílio Ferreira que já coloquei aqui?

"Porque na cidade vive-se sempre na rua, mesmo que se esteja em casa. E o que existe é o ser-se em relação e não a sós connosco. (...)"

- Mas não vais sózinho. Isso não coloca em causa esse desejo de introspecção?
- Creio que não. Sei que a minha companheira de viagem também precisa de suspender a cadeia dos dias a fio e deitar os dados na areia molhada. Desejo que seja bom para os dois.

Sem comentários: