28.3.06
Da grandeza das coisas
K. nota que, na sua vida, os detalhes, o pormenor, as pequenas coisas (uma palavra surpreendente, um desencontro, algo que não chega a ser dito...) têm uma importância desmedida, aparentemente desproporcionada se posta em relação com as grandes coisas da vida (as ideias, as teorias, os grandes temas...). Para o bem e para o mal. Assim, K. constata que pode até concordar com certas pessoas a nível ideológico, político, ou até filosófico (admitindo-se aqui que K. tem alguma espécie de filosofia, coisa muitíssimo duvidosa), mas revela-se incapaz de as sentir como próximas de si se as mesmas manifestam uma incapacidade gritante de compreender a importância de uma vírgula ou de um ponto final (ou a sua ausência) num verso de um poema. Porque é um universo inteiro que pode estar contido numa só vírgula, num só ponto final. Por isso, K. fica seriamente preocupado quando são os seus adversários ideológicos, políticos, ou até filosóficos, a manifestar um apreço genuíno por esse tipo de detalhes, pormenores e pequenas coisas. Porque K., colocado hipoteticamente na posição extrema de ter de escolher entre as grandes e as pequenas coisas, não é agora capaz de dizer, de modo peremptório e franco, qual dos dois campos escolheria. K. compreende, neste passo, como é relativa a grandeza das coisas na sua vida. E, como para provar a si próprio que afinal possui um olhar filosófico sobre o Ser e a Existência, arrisca mesmo que isto é válido não só para um entendimento mais profundo e amplo da sua vida, mas da Vida. É então que K. percebe que já não está a falar das pequenas coisas, e que o seu discurso é já o Discurso Sobre as Grandes Coisas. Pelo que agora só lhe resta uma alternativa: esboçar um sorriso (que é mais um trejeito, ou um tique) e colocar um ponto final no seu post. Uma, feitas bem as contas, bem pequena coisa.
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