31.8.06

As Luzes & as Trevas


Deitado a ler no sofá da sala, a minha atenção desvia-se das palavras por causa do zumbido que vem do tecto. Procuro vislumbrar a fonte do som. E noto, depois de um olhar, que no interior do globo do candeeiro com três lâmpadas de 60 voltes cada, onde jazem os restos mortais de algumas dezenas de pequenos insectos, uma nova vítima, de dimensões um pouco maiores, bate as asas, roda num intenso frenesim, em volta de si própria e das lâmpadas, até que se encolhe, dobra e morre. As luzes aquecerão e secarão o corpo do insecto morto até que este se transformará em pó. Mas também pode acontecer que eu, por motivo de alguma lâmpada fundida, retire entretanto o globo do candeeiro para o limpar e passe um pano húmido na sua parte côncava... As luzes tornar-se-ão, neste caso, mais intensas, mais fortes, mais atraentes para os insectos nocturnos que as virão procurar. Para nelas, encadeados, morrerem.

102 minutos


Já li cerca de 100 páginas ...
Uma descrição dos acontecimentos muito bem feita parece-me ...
Apesar de ser um tema arrepiante tenho de dizer que foi uma boa prenda este livro ...

29.8.06

Voo 93 (de Paul Greengrass)


Não é um grande filme. Talvez seja preciso mais tempo para se fazer um grande filme sobre o tema. Ou um grande cineasta (como Oliver Stone? Aguardemos por World Trade Center...). Mas consegue ser suficientemente interessante por uma razoável quantidade de razões. Desde logo, por optar, na primeira parte, por um olhar realista, quase documental, sobre os acontecimentos do 11/09 a partir do ponto de vista das autoridades aeronáuticas, militares e políticas americanas, mostrando a sua incapacidade para responder, de forma estruturada e coordenada, às acções terroristas daquele dia. O império com pés de barro em toda a linha! (aguardemos também os próximos desenvolvimentos sobre os acontecimentos posteriores em Nova Orleães; há notícias, por exemplo, de trabalho de Spike Lee nesse campo...). Depois, há o momento em que revemos as imagens televisivas reais da CNN, tantas vezes vistas mas sempre tremendas, arrepiantes, assustadoras: o fumo na Torre Norte; a aproximação e embate do segundo avião na Torre Sul... Os momentos mais fortes e intensos do filme são esses (com Greengrass a sublinhar o impacto das imagens nas pessoas - controladores aéreos, militares, etc - com momentos de silêncio ensurdecedor), o que sugere que a "ficção", neste caso, dificilmente terá a mesma força que os acontecimentos reais. Finalmente, na segunda parte do filme, o realizador propõe uma versão sobre o modo como se terão passado as coisas naquele dia com o voo 93 da United Airlines, o único dos aviões sequestrados que não atingiu o alvo. É uma versão baseada nos registos das chamadas telefónicas feitas pelos passageiros a bordo, necessariamente breves, emocionadas a um ponto difícil de calcular, lacunares. Talvez esteja aqui uma das razões para um certo aspecto de projecto falhado que o filme tem, já apontado por João Lopes na sua crítica no último "6ª" do Diário de Notícias: "personagens bidimensionais, ilustração "literal" dos factos conhecidos"(p. 26), opção que impede uma aproximação efectiva, profunda, do espectador às personagens (que, de facto, quase não chegam a existir). Teria sido necessário assumir o filme como filme, isto é, como ficção, para que os resultados nesta segunda parte fossem outros, cinematograficamente relevantes. De qualquer modo, ficamos com uma imagem final dos passageiros que faz justiça à sua coragem e capacidade de sacrifício, enfrentando, de corpo aberto, os terroristas. E essas virtudes não deixam de nos colocar questões: seriamos capazes de fazer o mesmo? Como reagiríamos numa situação de crise desta dimensão? Questões que sublinham o heroísmo das pessoas que preferiram agir em vez de ficar, passivamente, à espera que as coisas acontecessem. Só se lamenta que o filme não nos permita conhecê-las verdadeiramente...

28.8.06

Mestres

Grandes Mestres da Pintura Europeia:
de Fra Angelico a Bonnard. Colecção Rau
18 de Maio a 17 de Setembro

Fui ver a exposição no domingo à tarde (mau dia para visitar museus ...) mas apesar de tudo vale a pena. Vale pelos trabalhos presentes das escola flamenga, holandesa e alemã. Tem alguns trabalhos espectaculares ... Lamento é que tenha apenas um único trabalho do El Greco ...

Não consigo colocar imagem alguma pq esta treta do blog está marado ... ou é da minha ligação ou isto está completamente atrofiado!!

26.8.06

O Pós-Modernismo Ensinado às Crianças (cá de casa)

O café afinal faz bem; Plutão já não é um planeta a sério; as grávidas de Elvas preferem Badajoz; o Benfica não joga no Domingo... o que se seguirá? Que a terra não é redonda? Que Os Lusíadas não são obra de Camões? Que um tufão no outro lado do mundo provoca o batimento das asas de uma borboleta aqui? Sim, eu sei, "mudam os tempos", etc. Mas não podiam fazer o favor de ir um pouco mais devagar?

Contas à Vida 2

O filho faz as suas contas, o pai procura escrever os seus poemas. Com uma diferença: enquanto o filho, mais tarde ou mais cedo, com maior ou menor esforço, chega ao fim com os resultados todos certos, o pai não. Nem resultados, nem certos. Mas continua a tentar...

Aproximação do Fim das Férias:

já vejo a bocarra do túnel ao fim da luz.

25.8.06

J.azzy

(da série Mitos Urbanos)

X-ray Eyes

Procura-se

23.8.06

Peixe & Uvas por Armas





A Perca do Nilo é um predador que, introduzido no âmbito de uma "experiência científica" no Lago Victória, na Tanzânia, em meados do século passado, tem destruído todo o equilíbrio ambiental dessa área no coração de África. É o ponto de partida para um documentário que é, como o titulo diz, um verdadeiro pesadelo: fome, pobreza, doença, miséria extrema, morte, tráfico de armas, produção industrial, lucro medido em toneladas, guerras. E pessoas, crianças, mulheres, homens no meio de tudo isto. Como diz um piloto russo: "Não tenho mais palavras." E di-lo depois de contar, a medo, numa atitude de auto-purificação para a câmara, uma história sua: "Uma vez, para Angola, levei uma espécie de máquinas pesadas... Tanques! E depois voei para Joanesburgo, onde carreguei o avião com uvas. Um amigo meu disse-me: as crianças de Angola recebem, no Natal, armas! As crianças da Europa uvas..." Depois, com lágrimas a assomar aos olhos, concluiu a sua história: "Gostava tanto de ajudar todas as crianças do mundo. Mas não sei como... Há tantas mães... Não tenho mais palavras". Eu também não. Passou hoje no Gallery, às 23 h.

(O Pesadelo de Darwin, de Hubert Sauper, 2004)

22.8.06

Prelúdio

As Muitas Cores do Mar

Hoje de manhã, na praia, cruzamo-nos com os pais de um antigo amigo de infância e adolescência, com quem nos fomos incompatibilizando por questões de afinidade e feitio. Mesmo assim perguntamos por ele. A mãe diz-nos que está bem, que as coisas vão correndo normalmente e que o filho, praticante de mergulho, em Setembro ou Outubro irá mergulhar no Mar Vermelho... A pequena conversa terminou dali a pouco, e os pais do meu antigo amigo continuaram a sua caminhada matinal pelo areal. Nós virámo-nos para o mar e fomos entrando nas águas frias, mas familiares que se estendiam à nossa frente. Entrando no mar tão azul, tão verde, tão cinzento, mas não vermelho, da Fonte da Telha...

A Casa

Durante o processo de redecoração das paredes cá de casa, alteramos o lugar de certos quadros, de algumas reproduções, penduramos coisas novas e novas coisas, entretanto compradas, ou recebidas como prendas de amigos (um certo Calvin calvo, uma espécie estranha de avestruz fumadora...). Usamos pregos de aço; conseguimos tapar uns quantos, mas outros ficam à vista, pontos negros na pele das paredes. Decidimos arrancá-los. E, depois, ficam pequenos buracos, como cáries dentárias, a tapar um dia destes com betume. Uma casa é um corpo vivo. Tem maneiras de se arranjar, de se pôr mais bonita. Mas também tem as suas doenças. Cuidemos dela, que cuidará de nós. Ouvem como respira? Sentem os batimentos cardíacos?...

21.8.06

Pormenor

"A realidade não é a verdade. (...) A realidade é apenas um pormenor".
in As Velas Ardem Até Ao Fim, Sándor Márai, Dom Quixote, 2001

O que faz de uma imagem um ícone? Um momento único, irrepetível, que marca o curso da história, certamente. Uma revelação, um choque, uma prova do real. Também. Um dedo apontado à consciência de quem espreita. Uma brisa especial, capaz de soltar sorrisos em diferentes latitudes.

"Escolhe uma fotografia, uma só, do teu álbum pessoal. És capaz?"

Morreu o fotógrafo Joe Rosenthal



21-08-2006 - 16:59
Morreu o fotógrafo Joe Rosenthal
A imagem de um grupo de soldados americanos a içar a bandeira do seu país no final da batalha pelo controlo da ilha japonesa de Iwo Jima transformou-se num ícone. O seu autor, Joe Rosenthal, morreu ontem, aos 94 anos de idade. Foto: Joe Rosenthal/AP
in Público
21-08-2006

Maigret


As investigações do comissário Maigret

Vocês são mais novos do que eu, não sei se se lembram de ver esta série nos idos anos 70 ... não sei se voltou a dar ou não ... com este actor francês falecido em 2001, Jean Ricahrd, ele fez perto de 90 episódios de "As investigações do comissário Maigret". Comprei tb uns DVDs com os 1ºs seis episódios (1967/1968) ... tudo muito realista, preto e branco, sem músicas ou efeitos ... só a investigação policial ... eu lembro-me de ver esta série às quintas ou sextas à noite com o meu pai por volta de 1976/78 ... lembro-me q começava por volta das 23H ... era um serão bestial a dois a ver esta série ... nem toda a gente gostava pq era um pouco parada ... Sempre Paris em fundo ... rio, enquadramentos "à BD" ... era fan na altura ... e ainda o sou ... Com pena minha nunca li nenhum livro do autor:
Georges Simenon. Fiquei sempre com a música na cabeça ... nunca me esqueci ... as tais memórias de "ainda" criança ... nostalgia a preto e branco ...

Smoking / No smoking


Smoking / No smoking/Alain Resnais/1999

Com: Sabine Azéma e Pierre Arditi

Este fim de semana comprei na fnac dois dvds de um filme/dois filmes que eu acho terem sido dos projectos mais originais do cinema europeu nos últimos anos ... Não sei se viram ... se quiserem empresto ... OU :-) não se pode dizer ...

20.8.06

Blog ...

Estou um pouco cansado desta coisa do blog.
Já tentei colocar aqui uns posts mas todos os dias tenho de pedir nova password ...
Acho q isto mudou para o Google e piorou ...
Enfim ...

Figuras de Retórica

Das figuras de retórica, a que preferia era a elipse. Foi por isso que resolveu apagar todas as palavras do texto que agora deveria aparecer aqui.

Ordem de Trabalho(s)


Trabalho doméstico ordinário: limpeza e aspiração da casa, lavagem de roupa, reposição de lençóis limpos nas camas, preparação de refeições, mediação de conflitos entre os dois rapazes, saída para compras, etc. Trabalho doméstico extraordinário: colocação de quadros, reproduções & outros objectos nas paredes dos quartos, da sala e do corredor. Patchwork? Work in process.

19.8.06

Adagio sostenuto



A Dor

Fugimos dela como o diabo da cruz mas ela faz-nos falta. Que o digam os pais do João Maria, 3 anos, o único caso português conhecido de insensibilidade à dor com anidrose, cuja história nos conta hoje, no DN (*), com sensibilidade, a jornalista Sónia Morais Santos (a versão em papel tem mais informação). Com a dor de uma queimadura, aprendemos a respeitar o fogo; com a dor de uma pancada, descobrimos a fragilidade do corpo; com o rabo dorido de uma palmada, interiorizamos uma regra do mundo dos crescidos.

Uns anos depois, o que aprendemos nós com as dores – digamos – do coração?

(*) noutro registo mas também com prosa cuidada, vale a pena descobrir ainda, na edição de hoje, um recanto pouco recomendável da nossa capital europeia

18.8.06

Livros 2


E não é uma metáfora - os livros são mesmo cortantes. O meu dedo médio da mão direita que o diga (ou escreva, em nome da exactidão). Cortou-se nas páginas-lâminas de A Árvore das Palavras, de Teolinda Gersão. Pacto de sangue? Tenho de ler primeiro, depois direi.

Livros 1


Arrumações de Verão durante dois dias, que só deram para a garagem, lá em baixo, e para a Sala dos Livros, cá em cima. Noventa por cento do tempo e da energia foram dispendidos a limpar e a dar uma ordem, sempre precária e provisória, à Sala das Palavras. Centenas (milhares?) de capas & lombadas, de páginas & poeiras, bichinhos rastejantes e visíveis & milhares (milhões?) de ácaros invisíveis deixam-me de rastos, vergado sob o peso de tanta Inteligência, Sabedoria, Sensibilidade, Bom Senso e Pó. Não sei se os Livros ajudarão a trazer luz ao mundo, mas verifico que me deixam as mãos completamente negras de sujidade. Terá sido esta a razão para a Marguerite Yourcenar ter escrito A (sua) Obra ao Negro?

Mudanças Bloguianas ...

Meus caros, acho que houve mudanças no Blogger ...
Eu tb perdi as passwords e outros dados ...
tive de pedir nova password ...

17.8.06

Já faltou mais...

... embora ainda seja muito! Não quer dizer que o senhor que se segue seja muito melhor mas dificilmente será pior do que este.
(Please, don't feed the beast!)

16.8.06

Farpela

Hoje comprei um fato para ir a um casamento. É um facto que não me fica mal mas sinto-me sempre um pouco actor. É uma questão de pele. Não do fato, de facto. É o factor do acto, de fato.

Pedras & Cebolas


"Que vem a ser isso de Paz, afinal? Cá para nós, a guerra nunca acabou."
Günter Grass, O meu século, Ed. Notícias, 2001, p.127.

Câmara Escura 3

Na televisão vejo uma reportagem sobre as doenças dos olhos. Fadiga, miopia, astigmatismo, cataratas e outras bem mais graves. Um especialista afirma que os nossos olhos foram feitos para verem ao longe (para divisar o horizonte, avistar presas e predadores...) e que nós os forçamos, cada vez mais, para verem ao perto. Outro refere que a leitura, a tv e os computadores contribuem para o aparecimento e agravamento dos males dos olhos. Estamos condenados a isto: ao desejo de ver mais longe, mais fundo, mais claro, desgastando até à retina o nosso sentido mais precioso. Escrevo estas palavras no ecrâ luminoso, sentindo os olhos, cansados, a doer. Sim, preciso de dar descanso a estes que a terra há-de comer...

Um Post de Hoje Hoje

Depois do tempo, energia e nervos gastos com passwords, usernames e outras leviandades do género, dizer apenas que este é o único post do dia de hoje. Pelo menos até este momento do dia de hoje. São 19 horas, 9 minutos e alguns segundos. Agora, se me dão licença, com o tempo, a energia e os nervos que ainda me restam, vou ajudar uma mãe a tomar conta de dois filhos...

Um Post de Ontem Hoje 4

O país arde. O ministro António Costa, sorridente, fala às televisões sobre os 66 bombeiros portugueses que foram combater fogos na Galiza. 7ooo pessoas combateram esses fogos. O ministro António Costa, sorridente, diz que devemos estar orgulhosos, como portugueses, destes bombeiros (e uma bombeira!, numa relação esmagadora de 65 para 1: o ministro António Costa não poderá arranjar um sistema de quotas eficaz para termos mais bombeiras?). O ministro parece orgulhoso. Eu pareço orgulhoso. Até tu pareces orgulhoso. O país também parece orgulhoso. E continua a arder.

Um Post de Ontem Hoje 3

Entramos numa loja da PT para resolver um problema com o telefone fixo. Ao balcão, um ex-aluno meu. A meio da conversa sobre fios, baterias, cargas e outras questões de suma importância, pergunto:
- Então, R., e qual é a sua situação aqui na empresa?
- Vou sair no final do mês. Vou para o Centro Cultural de Belém.
Surpreendido com a inusitada vocação cultural do rapaz, que eu nunca vislumbrei durante as nossas relações pedagógicas, volto a perguntar:
- Centro Cultural de Belém? Por opção sua?
- Sim. O meu padrinho é um superior lá e arranjou-me um lugar.
- E o que vai fazer?, pergunto, rendido ao nível cultural do diálogo.
- Isso não sei. Mas hei-de fazer alguma coisa, uma profissão, e hei-de orientar a minha vida. Depois vejo com o meu padrinho... (nesta parte, riu-se).
Saio da loja da PT com um telefone substituto e com a impressão de que, mesmo sem fios visíveis, isto (as comunicações, a cultura, os padrinhos...) anda tudo ligado.

Um Post de Ontem Hoje 2


Chegamos a casa e precisamos de fruta e legumes para fazer uma sopa. Só quando saímos para as compras damos pelo facto de ser dia de Assunção de Nossa Senhora; dia feriado em versão profana, portanto. Grande parte do comércio (não todo!) está fechado para descanso do pessoal e suposto recolhimento espiritual. Mais um sinal do princípio do fim das férias: somos obrigados a sentir a existência do calendário que regula os dias (ou serão os dias a regular o calendário?). Uma definição possível de férias é: "perder quase por completo a noção dos dias, sentir apenas a sua passagem, junto ao mar, debaixo do azul do céu, sem sabermos se estamos numa terça ou numa quarta-feira..." Sim, ontem foi terça, hoje é quarta-feira. Recuperei a noção dos dias. Longe do mar, debaixo das cinzas do céu.

Um Post de Ontem Hoje 1

Depois de 15 dias de sol, regressamos a casa. O dia nasce e mantém-se fresco e cinzento, bom para viajar para norte. Como se o Outono quisesse assomar a meio de Agosto. Ou será que todos os regressos do sul têm em si um inevitável sabor outonal?

15.8.06

03:30 a.m.

Constantinopla, Madagáscar, Lisboa. As pálpebras pesadas.

O Fogo e a Água

Dizem que vem chuva. É bom para apagar os incêndios. Dizem que é melhor irmos contando com isto: um clima temperamental, à nossa imagem.

14.8.06

Representação (2)

O novo blogue do presidente do Irão tem um cabeçalho estilo papel de parede mas não dispensa um feed RSS para manter os leitores actualizados sobre novos desenvolvimentos. Para já, só tem um (longo) post, onde Ahmadinejad nos conta a vida dele desde pequenino, prometendo ser mais simples e conciso, nas futuras mensagens. O blogue tem versões em farsi, árabe, inglês e francês, o que nos leva a pensar que o presidente do Irão quer que o seu blogue chegue a muita gente. Uma generosa vontade de comunicar, que contrasta com a vigilância a que estão sujeitos os media e a internet no país dele, onde a polícia anda a dar caça às antenas parabólicas, que permitem captar emissões tv estrangeiras.
A este propósito, é interessante lembrar uma passagem da recente entrevista de Ahmadinejad ao programa 60 Minutes da televisão norte-americana CBS. Questionado pelo jornalista Mike Wallace sobre a questão das armas nucleares e o facto de Bush dizer que vai impedir que Teerão tenha a bomba, o presidente do Irão disse: "O problema é que o presidente Bush pensa que pode resolver tudo com bombas (*). O tempo das bombas já passou. Ficou para trás. Hoje vivemos uma era de pensamentos, diálogo e trocas culturais."

(*) Uma afirmação muito lúcida, by the way.

Representação (1)

(Foto: Estudios Revolución)

Apertam as mãos, sorriem, exibem presentes, comem uma pequena merenda (iogurte?). O jornal Granma, principal periódico cubano, mostra hoje a visita que o venezuelano Hugo Chávez fez ao seu amigo/aliado Fidel Castro, por ocasião dos 80 anos do comandante. O presidente cubano mandara dizer, na véspera, que os cubanos se preparassem para “qualquer notícia adversa”. Estará de regresso ao poder em breve? Ou está mesmo a representar a saúde que já não tem?

13.8.06

03.45 a.m.


Não se trata de acordar com as galinhas, é mesmo acordar as galinhas!

12.8.06

O Sax e a Cidade

A tuba titubumbeou e tu tu tu bóóóóó bóóóóó e saxofonavosax fonn fiii fon fan e tal ilátrás a bateria carregada tac tac tum tum tss tss,tsc pum tss pac ilogolado o xilofone cuseu linguajar dôssassim plim plem pim pla pli plim plom pluma enquantuviolino namema linha fiiii fi fiiiiiii do contrabaixo plom plom zumm zumm e os gemidos do trompete uá uá uá.

O homem pegou na ampulheta e virou-a, pousando-a sobre uma cadeira almofadada, ao lado do suporte da pauta. A areia branca começou a escorrer lentamente, durante uma hora. Quando caiu o último grão, o homem disse os nomes dos músicos, agradeceu e sairam todos. Voltaram duas vezes só para mais umas vénias. A música é uma das grandes magias humanas. Esta noite, levou-me por complexas metrópoles, selvas densas repletas de bichos, mecanismos, organismos, até um ou outro planeta, ao fundo do mar, à garganta de um pássaro.

Banda sonora: Anthony Braxton 6Tet, anfiteatro ao ar livre da Gulbenkian, encerramento do Jazz em Agosto

Felizidade

O que é feito da revolução? “Poderemos fazer a revolução para o proletariado, contra a vontade do proletariado?”, pergunta-se (lembra-se), a dado passo, no filme Os Amantes Regulares, em pleno Maio de 68. Não, Philippe Garrel não fez um filme político (ou será que fez?). Apresenta-nos um filme feito com “a câmara no lugar do coração”, como ele próprio terá dito. E não será só pelo facto do filho (Louis Garrel) ser o protagonista masculino e o pai (Maurice Garrel) aparecer numa cena, estranha mas bela. Lendo crónicas e biografias, ficamos a saber que o realizador tinha 20 anos em Maio de 68. Será possível regressar a um tempo desses sem ser com o coração nas mãos?

Na primeira parte, a câmara demora-se nas barricadas de rua, filmadas com um ritmo a que os nossos olhos não estão habituados, “como insólitos sketches de reportagem, dilatados até uma duração insensata, em tudo e por tudo contrária ao primarismo simbólico da maior parte dos olhares televisivos”, escreve João Lopes no DN. O filme é longo (3 horas) e exigente.

Apagada a chama da revolução colectiva (embora, perto do fim, uma personagem lembre que as utopias são imortais) resta o desejo de uma (r)evolução pessoal, onde o amor é herói e vilão. François e Lilie jogam-se nesse turbilhão onde há inocência, fome de sexo e do mundo, ambição, frustração, alegrias e dor. Uma procura da felicidade, que se revela “a preto e branco” como titula a crónica de João Lopes, lembrando uma frase de Maupassant: “A felicidade não é alegre”. Também por isso, a fotografia B&W, com muito grão e contraste vincado, é digna de nota (foi premiada no último Festival de Veneza). A actriz Clotilde Hesme tem momentos de feitiço.

11.8.06

Calendário

01. Uma destas manhãs, nas minhas caminhadas pelo Jardim da Estrela, estava uma mochila abandonada num banco de madeira. Era velha e parecia vazia. Se estivesse em Londres ou NYC, teria alertado a polícia. Aqui, dei mais umas voltas entre as árvores, suando um pouco a camisola e forçando os músculos. Cantinho à beira-mar plantado, não é?

02. Perante as notícias de um massacre abortado pelas autoridades britânicas, há quem se atire ao bloco de esboços das teorias da conspiração: "É uma crise que dá muito jeito: volta as assustar as pessoas com o perigo [real, certamente] do extremismo árabe, dando mais uma folga a Israel (no Líbano e Palestina) e aos EUA e GB (no Iraque)." Custa-me a acreditar mas não digo que seja impossivel. O mundo não é a preto e branco. E os mortos em Nova Iorque, Madrid e Londres não foram uma teoria da conspiração.

9.8.06

Camara Escura II

03-08-2006 - 23:56
A diferença que faz um bombardeamento
Estas duas imagens de satélite captadas pelo GeoEye mostram a mesma área de Beirute, no Líbano, antes e depois de um bombardeamento israelita. A imagem da esquerda foi tirada a 12 de Julho; a da direita, a 31de Julho. Foto: GeoEye/AP
in Público

Câmara Escura

Há um hálito de suor no corpo, afagado pela vaga brisa que se insinua pela janela aberta, ainda antes de abrir os olhos. Como (quase) sempre, não me recordo do que sonhei – sonhamos sempre, não é? Pode ter sido um pesadelo terrível ou a mais doce das efabulações, nunca o saberei. Será que importa?
Não sei muito bem porque escrevo, ainda com um resto de café na primeira chávena do dia. Talvez seja uma forma de ganhar balanço para aparar a barba: um gesto concreto, prático, com efeitos visíveis. Como se fosse preciso uma dose de fantasia antes de enfrentar o real (as primeiras notícias da manhã não passaram de um quase zumbido). Há muita folga nos meus dias, que eu posso preencher como quiser. Tenho listas espalhadas por blocos, pequenos cadernos, folhas soltas, frases sublinhadas em livros. Tenho mil desejos e pés de chumbo. Escrevo nesta folha: descomplicar. Bebo o resto do café, levanto-me e dirigo-me à casa de banho. Empunho a máquina, carrego no botão e corto, rente, a melancolia.

Direitos de Autor

Um homem, que trabalha numa loja de fotocópias, fotocopia-se. Fotocopia-se. Fotocopia-se, até encher o mundo, numa alucinação clone.
A acção foi filmada com uma câmara digital e depois as imagens foram manipuladas em computador. De seguida, com uma impressora laser, passaram-se 18 mil imagens para papel, que foram filmadas com uma câmara de 35 mm. Engenhoso e divertido, com uma nomeação para óscar. Fico com vontade de ver outras coisas dele.

Copy Shop, Real. Virgil Wildrich, Áustria, 2001 (12')

7.8.06

Conduta

Abro a torneira e nem uma pinga. Praguejo, com a t-shirt ainda suada da caminhada matinal. Telefono para o piquete e uma gravação informa-me que há uma ruptura inesperada, numa conduta, a duas ruas de distância. “Calculamos que o problema esteja resolvido por volta do meio dia e meio”. Damos sempre por adquirido que as torneiras deitam água e outras pequenas coisas no nosso quotidiano. Nem sempre há um piquete para nos dizer o que se passa e quando estará o problema ultrapassado.

6.8.06

Névoa

Há, nos Diários da Bósnia, de Joaquim Sapinho, um pudor que penso entender, no retrato de um corpo ferido. Os Diários resultam de duas viagens a Sarajevo e outras localidades, a primeira em 96, pouco depois do fim do cerco, e a segunda em 98. Há um ritmo na contemplação, na procura dos sentidos de cada imagem, paisagem, rosto, que nos deixa a pensar sobre os efeitos de uma guerra como aquela que implodiu os balcãs. É um documentário muito pessoal mas também muito oportuno (demorou 10 anos a concluir), no momento em que somos bombardeados de manhã à noite com uma outra guerra, quase em directo, traduzida de forma fria em nomes de mapas, estatísticas de vítimas, esquissos de diplomacia. Há um silêncio feito de caliça, fumo e cinzas, depois do choro e dos gritos dos telejornais, que dificilmente cabe nos telejornais, nos radiojornais e nos jornais de papel.

Há um manto espesso de neve que não nos deve fazer esquecer as árvores e as ruínas. Há uma névoa dormente. Há mulheres muçulmanas, rezando e cantando e depois puxando uma fumaça de um cigarro, com os lábios pintados e os cabelos escondidos sob um lenço. Há o homem que sente urgência em partilhar a história de como destruiram a aldeia vizinha – vamos pelo túnel, até às ruínas, com as ruínas de um homem. Há restos de um teleférico sem passageiros que ainda mexe, no local dos Jogos Olímpicos de Inverno de 84, e que hoje é uma reserva de sérvios para quem a guerra “ainda continua”. Há uma casa que parece uma caveira e uma praga de acne de chumbo, com as paredes carregadas de buracos e rasgões. Há poucas palavras, para o bem e para o mal.

5.8.06

Despertador

O corpo humano é uma realidade muito complexa e fascinante. Enfim, uns são mais fascinantes do que outros. Uma certeza de quem até gosta de acordar cedo: o corpo humano não foi feito para ser arrancado da cama às 4 da manhã.

4.8.06

Blue



200 metros, nem tanto

Segunda Circular, 12:22 ( tenho a certeza da hora porque escrevi nas costas de um papel do multibanco para o caso de vir a ser necessário). Na berma está um carro azul com um barco amarelo atrelado. Parece empanado mas nunca se sabe. Já ficou para trás.

A rádio dá música de filmes.

Big Cheese

Nirvana
Album: Bleach

Big cheese Make me

Mine says, "Go to the office"

Big cheese Make me
Mine says, what the hell?

Black is black, no trading back
We were enemies
Show you all what a man is [Sure you are, but what am I?]

Big lies make mine
Mine says "Go to office"

Big cheese Make me
Message? What is it?

Black is black, no trading back
We were enemies
She eats glue, how bout you?

3.8.06

Os livros como tijolos

No átrio do Centro de Arte Moderna da Gulbenkian, uma instalação do eslovaco Matej Krén, com livros editados pela Fundação nos últimos 50 anos. Chama-se Book Cell e é mais um trabalho deste artista, utilizando os livros como tijolos. Uma bela ideia e uma metáfora acertada, para ver e atravessar (cuidado com as vertigens!) até ao final deste ano.

(fotos: j, Agosto 2006)

Pintar (com) caretas

(Imagens: Universidade de Bath)
E se um quadro se adaptasse ao estado de espírito de quem o está a observar? Uma equipa de peritos norte-americanos e britânicos desenvolveu uma técnica que permite tornar real esta hipótese. Tem piada embora não se perceba muito bem o interesse da coisa. E não devia ser ao contrário - pergunta M. -, com as cores mais alegres a surgirem às pessoas mais tristes?

A Folga

(foto: j, Brunheiras, Julho 2006)

Estou de folga, hoje e amanhã, antecipando o descanso da sobrecarga de turnos, no fim de semana. Manhã cedo fui à garagem buscar o automóvel, que acaba de ser submetido à obrigatória revisão dos 30 mil quilómetros - mudança de óleo (Energy Premium 10W40, esclarece-me a factura) e outras minudências, incluindo, espero, a verificação de algumas folgas nas correias e noutros tendões e músculos dos cavalos de origem francesa. Depois de regressar a casa, com pão fresco, bebo um imenso copo de sumo de laranja, espreito a Visão, escrevo um post no blogue e olho para “o que sobra de pano”, neste primeiro dia de “desafogo” oficial. A páginas 3919, o dicionário Houaiss lembra que folgado é “livre de tarefas, de deveres; descansado” mas também “bambo, desapertado, frouxo, lasseado, lasso, laxo(...)”. Livre de tarefas, ponho o meu melhor ar bambo e desapertado e ala!

Linguagem Gestual

Também na Visão desta semana, uma entrevista a Eduardo Prado Coelho, 62 anos, intelectual coscuvilheiro, como ele próprio admite. A propósito da doença com que convive nos últimos tempos, uma colangite, EPC diz que “o corpo só se sente verdadeiramente na doença” e lembra uma expressão utilizada por Hervé Guibert, um companheiro do filósofo Foucault: “todos os dias, perco um gesto”. EPC concorda: “Todos nós, a partir de certa altura, perdemos gestos. Perdemos a capacidade de fazer não-sei-quantas-piscinas.”

Penso que a maioria de nós não tem consciência dos gestos que compõem o eu, no dia a dia, embora exista uma grande vigilância sobre os gestos do outro. Talvez os actores e os bailarinos tenham maior consciência do corpo, na acção quotidiana. E os dândis, claro! E depois, há gestos que se perdem de forma consciente, e outros que se dissipam sem darmos conta disso. Os meus gestos de fumar que, em boa parte, eram gestos conscientes e que ajudavam a definir a minha personagem (veja-se os desenhos de PB), foram apagados de forma intencional. Correr desaustinado para apanhar o autocarro foi um gesto que ficou pendurado há alguns anos, na fronteira da idade adulta. De uma forma geral, quando penso retrospectivamente os meus gestos dos últimos tempos, sinto que há uma desaceleração, os gestos parecem ter menos urgência. Isso é evidente na forma como conduzo. Mas há ainda muitos gestos crispados. Também por isso, não devemos esperar pela doença para sentirmos de que carne, osso, músculo e gesto somos feitos.

Outra Visão (ainda Antonioni)

Numa crónica que intitulou "A perfeita imperfeição", João Mário Grilo escreve hoje na Visão sobre a reposição, em cópia restaurada, de Profissão: Repórter e o lançamento de uma nova edição em DVD de Blow-Up. Na opinião do cronista, estamos perante "dois filmes brutais, principalmente pelo modo como as suas personagens "saem da estrada", como abandonam os seus destinos e o programa codificado e seguro de peripécias que eles prometiam (...)".

Raízes e Poeira

De que foges? – pergunta a rapariga ao homem, a partir do banco de trás do descapotável branco, americano, com matrícula de Madrid. Ele responde-lhe – Vira-te de costas para os bancos da frente. Ela vê a estrada a sumir-se, comprimida pelas margens com árvores cintadas de branco.

De que fugimos, quando damos por nós a seguir viagem sem destino, ainda que com uma agenda que não preenchemos, cheia de compromissos (nunca tão perigosos como os de um traficante de armas)?

Michelangelo Antonioni disse que Professione: reporter foi o filme estilisticamente mais maduro que realizou (em 1975). Foi um prazer descobri-lo, esta noite, no Nimas em Lisboa. A gramática do filme é magnética e o longo plano-sequência final é, de facto, de antologia. Não interessa muito para o caso, mas prefiro o título inglês: The Passenger.

1.8.06

A gosto

(Timothy A. Clary/AFP - Getty Images)

Eis o sexto mês do blogue, meio deserto. Em NYC todos se ensopam e ventoinham para combater a caloraça. Aqui, viramos mais uma página. Líbano, Fidel (ainda estará vivo, no momento em que "emite" um novo comunicado a dizer que não pode inventar boas notícias e que as más só servem o inimigo?), sentimentos mistos perante o castigo para os putos rufias que espancaram um transexual no Porto. Chamam-lhe silly season - estação tonta. Convém não facilitar.

(Creutzmann Sven / Gamma)