22.3.07

Não-acontecimentos Numa Rua da Mouraria

Uma gata amarela com riscas cinzentas. Para cá e para lá nesta rua, a meio da tarde, gemiando como uma mulher enganada por um marinheiro irlandês.

Uma mulher enganada por um marinheiro irlandês. Que ninguém viu.

Uma jovem empregada de uma loja de revenda de materiais de bijuteria, o preto como cor predominante do vestuário. (Desfez pedaços de pão em pedacinhos mais pequenos que atirou para o meio da rua. Os pombos - três, quatro, cinco...-, sob o olhar da gata amarela com riscas cinzentas, debicaram espalhafatosos.)

Uma mulher velha e uma mulher nova: passaram. Acompanhadas de um miúdo de 6 ou 7 anos que fez todo o comprimento da rua aos pontapés numa caixa vazia, amarela, na qual se podia ler, em letras castanho-escarlate, Friskies.

Um homem alto, fato castanho completo, sapatos de gigante, sem dúvida que à procura da direcção certa.

Um outro homem, mais baixo, talvez o padre, de meias e sandálias pretas. Entrou na igreja pela porta das traseiras, depois de bater três vezes.

Um rebanho de ovelhas do outro lado do rio, não-hoje, do outro lado da rua.

Um cavalo branco pela segunda vez: estático no meio do baldio suburbano, com uma colcha escura sobre o dorso contra o frio da noite. Já deste lado da noite, já muito longe da Mouraria.

1 comentário:

j disse...

Fiquei com muita vontade de ver este filme. Quando é que estreia?