1.10.06

Digestivo

Gosto deste restaurante do bairro, muito familiar. Ontem almoçei dourada com legumes. Hoje fui no cozido, apostando tudo nas couves, evitando repetir enchidos, resistindo à tentação de esvaziar o meio jarro do bom tinto da casa. É um daqueles sítios onde me sinto bem, quase em casa. Quando chego, os empregados saúdam-me, estendem a mão. “Como vai? Está sózinho?”. Que sim, pode ser na mesa junto à janela, inexplicavelmente tapada por um reposteiro. Espaço reservado, acolhedor. Telemóvel em silêncio, as gordas do jornal e logo a seguir a travessa, bem aviada. Olho em volta e descubro rostos conhecidos: famílias e amigos no ritual de almoçar fora, ao domingo. Saboreio. Quarenta minutos depois, paga a conta, recolho os pertences e dirigo-me para a porta. Um dos empregados despede-se e pergunta, com ar preocupado: “A esposa, está bem?”. Ainda com a boca-café respondo, surpreendendo-me, quase sem hesitar: “Está bem, tem andado por fora”. Familiar não quer dizer íntimo, não é?